A  frase do Cazuza “o nosso amor a gente inventa, pra se distrair” sempre  me fez parar pra pensar. Aliás, essa não é a única letra no qual ele se  refere sobre amores  inventados. Talvez ele já tivesse aproveitado os benefícios dos amores  de faz-de-conta, que foram bons enquanto duraram. E fiquei pensando  quantos dos nossos amores a gente também não inventa pra se distrair.
    Ainda não conheço sentimento que renova mais do que a paixão. Quando  você se apaixona, a vida parece ganhar uma camada de cor e verniz extra.  Fica tudo mais lindo, mais motivante, com mais sentido. A paixão  renova, dá combustível, dá motivos pra seguir em frente. É fácil  perceber de longe alguém que está apaixonado, porque o clichê se repete –  olhos brilhando, cabeça avoada, sorrisos sem motivo aparente, assuntos que se repetem e borboletas no estômago.
 
   A paixão vicia. Depois que você experimenta uma vez e descobre os  milagres que ela opera na sua vida, difícil querer viver sem. E é aí que  entram os amores inventados. Queremos tanto viver essa sensação que, o  alvo da paixão, às vezes acaba nem importando tanto. Encontramos alguém  potencial, mas que não era bem quem queríamos. Mas tudo bem. Ele é  legal, transa bem, te faz rir. Alguns motivos como esses já bastam – sem  titubear, pegamos o sujeito e o colocamos na forma, moldando de acordo  com o nosso imaginário. Os defeitos, jogamos pra baixo do tapete e os  mantemos lá até quando der. O importante é manter o combustível fluindo.   E o trabalho que estava ruim das pernas, já deixou de ocupar seus  pensamentos. A carreira estacionada, também. Problemas com a família, já  nem passam mais pela cabeça. Deixa tudo pra depois, que agora é a hora  de viver essa paixão linda. Mas, já estamos acostumados com o fato de  que uma parcela das coisas boas, têm efeitos colaterais – e não seria  diferente com os convenientes amores inventados. 
   Inventando paixões, corremos o risco de depositar no amor uma  responsabilidade que ele não pode segurar. Queremos uma vida nova, um  recomeço, o fim da rotina. Esperamos que o amor cure nossos problemas,  acabe com nossas aflições, nos aconchegue. Só que, como já era de se  esperar de um sentimento inventado, a ficção uma hora chega ao fim. Os  defeitos, antes, aquietados debaixo do tapete, passam a tomar forma.  Aquela mania dele irritante que você fingia não ver, toma proporções  absurdas. Algumas atitudes delas que você deixava passar, agora não te  descem mais na garganta.
      Assim, o conto de fadas chega ao fim. Sem o final feliz costumeiro. E,  com o fim da ilusão, todos os  problemas antes esquecidos, voltam a tona  – e aí que você percebe que perdeu mais um tempo da sua vida e não fez  nada para resolver seus problemas. Eles continuam lá, intactos. Às  vezes, até fortalecidos depois do período sabático ao qual foram  submetidos. E aí você percebe que, durante esse tempo todo, só encobriu  suas crises. Quando a deprê da ficha caída pega pesado, alguns até se  rendem novamente a algum amor inventado. Qualquer um, que não seja tão  insuportável, que deixe a vida mais leve. Só por hoje. Só por enquanto  durar.
 


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