2.
  Estou há vários dias escrevendo  esta carta mentalmente, pois na mente os erros ortográficos contam menos  que os erros de atitude, e só no que penso são nos erros, uma vez que  foram infinitamente mais constantes que os acertos. Não estou  organizando frases  para resumi-las num pedido de desculpas, pois nada me parece mais raso e  os meus erros merecem um pouco mais de consideração, já que foram tão  solenes e fartos, meus erros foram dos de tamanho grande, e há que se  ter por eles um desprezo de igual envergadura. Menina, só um amor  gigante provocaria esta nossa ruptura.
  Se não há explicação, ao menos sinto  verter por dentro um leve arrependimento, errei por razões mínimas porém  em vezes diversas, o que me confere fartura, ainda que não tenham sido  erros à sua altura. Menina, eu sei, você preferiria que eu tivesse acertado, mesmo que um acerto em miniatura.
  Talvez não seja da minha índole  agir com generosidade, é de família esta minha dificuldade em fazer os  outros felizes, mas, ao contrário, é dom da tua, pois fizeste da tua  felicidade a minha clausura. Que mistério é esse de tornar um homem  apático o rei da euforia,  de fazer de um homem sério o senhor da galhardia, de fazer de um homem  só um homem mais só ainda, por não antever mulher alguma que consiga  repetir esta aventura?
  Menina, por um triz não fui o que  esperavas de mim, faltou-me a coragem, não faltou-me a fissura. Para  sempre estarei a te escrever esta carta mentalmente, confusa e fria, mas  não impura, já que nela abdico dos meus erros e acertos para revelar  apenas o que em silêncio te dedico, um amor  injulgável, imedível, totalmente irresponsável, amor que abraça o  sofrimento para testar sua resistência e que acredita, de maneira um  tanto tola e quixotesca, que só este tipo de amor é que perdura.
 


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